9 de julho de 2008

'Medo? Só da Polícia Federal'


Considerado um dos mais brilhantes economistas de sua geração, Daniel Dantas cumpriu um longo caminho entre gênio das finanças e prisioneiro da PF. Aluno prodígio do exigente Mário Henrique Simonsen, quase foi ministro da Economia (governo Collor). Preferiu ficar no mundo das grandes tacadas financeiras e virou milionário, embora não goste de comer bem ou de viagens de luxo. O que gosta é de competir e ganhar dinheiro, a qualquer custo. Em sua última entrevista, à revista "Piauí", confessou seu único medo: "A Polícia Federal."

O baiano Daniel Dantas, de 53 anos, começou sua carreira freqüentando as páginas de economia dos jornais como um dos mais brilhantes magos das finanças de sua geração, após ter erguido um banco com a tradicional família Almeida Braga, o Icatu, em 1986. Após desavenças com os herdeiros de Antônio Carlos Almeida Braga, o Braguinha, desligou-se da instituição e fundou o seu próprio banco, o Opportunity, em 1994. Desde então, tornou-se figura polêmica no mundo dos negócios.

Formado em engenharia civil na Universidade Federal da Bahia, Dantas trabalhou no grupo Odebrecht em Salvador até se mudar para o Rio, aos 24 anos. Seu pai, Raimundo Dantas, empresário do setor têxtil, era amigo de infância do então senador Antonio Carlos Magalhães e tinha boas relações na política baiana. Mas desde cedo Dantas queria ter seu próprio empreendimento. Aos 17 anos, montou uma fábrica de sacolas com dois amigos e chegou a investir no ramo de distribuição de bebidas. Foi com os contatos que fez no Rio, porém, que se estabeleceu com força no mundo corporativo.

Na Fundação Getulio Vargas, onde cursou mestrado, foi aluno do ex-ministro da Fazenda Mario Henrique Simonsen. Sua dedicação - chegou a adiar seu casamento, com convites já impressos, para participar de um congresso organizado pela FGV - fez com que caísse nas graças do ex-ministro. Foi Simonsen quem o apresentou a Braguinha. Também chegou a indicá-lo para ocupar a pasta da Fazenda no governo Collor. Mas Dantas preferiu se manter afastado da carreira política, apesar de ter integrado a equipe que ajudou a fazer o plano econômico do então presidente.

À frente do grupo Opportunity, Dantas investiu em setores como telecomunicações, saneamento e transportes. Buscou assegurar a gestão de todos os negócios, apesar de ser minoritário no capital social das empresas. Seu estilo controlador fez com que colecionasse brigas judiciais. Os adversários nos tribunais vão desde fundos de pensão, como Previ, até companhias estrangeiras como Telecom Italia e Citigroup. Também trava disputa com seu ex-sócio no fundo CVC Opportunity Luis Roberto Demarco. Demarco o acusa de falsificar documentos para prejudicá-lo.

- Como todo empresário sério, Daniel é obrigado atuar num pântano de ameaças e conspirações. Ele enfrenta tudo de forma corajosa, mas dentro da lei, com transparência e moral - afirmou em 2004 o economista Mangabeira Unger, hoje à frente da Secretaria Especial de Ações de Longo Prazo e que prestou consultoria ao Opportunity entre 2002 e 2005.

Dono de um patrimônio estimado em cerca de US$1 bilhão, Dantas é avesso a exibicionismos. Não tem casa de campo ou de praia, nem apartamento no exterior. Também dispensa helicópteros e iates. Mas tem lá suas excentricidades. Desconfiado, não raro faz reuniões de mais de uma hora a bordo de seu jato particular, de forma que suas conversas não sejam grampeadas.

Vegetariano, tem hábitos regrados. Não bebe, não costuma ouvir música e sequer se dá o direito de ir ao teatro ou ao cinema. Sua vida é dedicada aos negócios. Sai de seu apartamento em Ipanema - uma cobertura de frente para o mar comprada em um leilão judicial e decorada com pôsteres do Museu de Arte Moderna de Nova York - por volta das 7h e só retorna após as 22h. Costuma fazer o trajeto até o trabalho em um Omega blindado, com motorista. Na sua cola, vai outro carro com ao menos dois guarda-costas.

Na empresa, impõe uma rotina dura a seus funcionários. Eles costumam entrar às 8h30m e não têm hora para sair. Busca manter pouco contato com eles. Dizem que teria pedido à irmã, Verônica Dantas, que trabalha com ele, que ordenasse aos empregados que não lhe dirigissem a palavra, sequer bom dia. Verônica não teria aceitado o pedido.

Entre seus novos desafios estão investimentos na área de etanol, considerado por ele o combustível do futuro. Já comprou 100 mil hectares de terra no Pará, para plantar cana-de-açúcar e desenvolver o combustível.

Fora do trabalho, Dantas leva uma vida solitária, apesar de casado. Embora more em frente à praia, não põe os pés na areia. Prefere fazer exercícios em casa, em uma academia particular no tempo que lhe sobra - dorme cerca de cinco horas por dia. Com poucos amigos, dedica seus fins de semana a leituras técnicas. Seu autor preferido é o americano Warren Buffett.

O banqueiro também é avesso à imprensa. A última longa entrevista que concedeu foi à jornalista Consuelo Dieguez para a revista Piauí, publicada em junho de 2007. Na ocasião, a conversa foi interrompida por um telefonema. Do outro lado da linha, o interlocutor queria avisá-lo que estavam tramando algo contra ele. Indagado pela jornalista se não tinha medo, Dantas respondeu:

- Não. Já me acostumei a viver assim. Só tenho medo da Polícia Federal.

Um prenúncio do que viria a ocorrer.

" Já me acostumei a viver assim. Só tenho medo da Polícia Federal"

Daniel Dantas, em junho de 2007, quando perguntado se tinha medo de algo

"Como todo empresário sério, Daniel é obrigado a atuar num pântano de ameaças e conspirações. Ele enfrenta tudo de forma corajosa, mas dentro da lei, com transparência e moral"

Mangabeira Unger, atualmente à frente da Secretaria Especial de Ações de Longo Prazo, em agosto de 2004.

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