7 de janeiro de 2008

Engenharia brasileira conquista novos projetos


Até que ponto o consumidor dos Estados Unidos realmente se importa em saber em que país foi projetado o carro que ele escolheu ter? Empresas como a General Motors apostam que essa informação não faz a menor diferença. A cada dia a GM reforça mais as equipes de engenharia fora da matriz. Centros de projetos como o do Brasil continuarão a desenhar veículos para outros mercados, inclusive o americano, segundo a vice-presidente da GM para a América Latin, Maureen Kempston-Darkes.

Estímulo para movimentos como esse não faltam. O governo brasileiro já acenou com o compromisso de, em breve, atender a um pedido das montadoras para a criação de linhas de financiamento especial do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), voltadas exclusivamente para a área de engenharia automotiva.

O ministro do Desenvolvimento, Indústria e Comércio, Miguel Jorge, já citou em mais de um discurso público a vontade do governo de ver essa indústria atingir a produção anual de 5 milhões de veículos, volume cerca de um terço maior que o previsto para 2008.

A migração da engenharia das matrizes para os países emergentes com competência para a criação de modelos tanto para o mercado local como para outros países começou bem antes do estímulo financeiro que pode vir do governo brasileiro. Há cerca de um ano e meio, a GM anunciou a inclusão de quatro subsidiárias, além da matriz, nos EUA, no plano da criação dos projetos das próximas gerações de veículos: Alemanha, Coréia do Sul, Austrália e Brasil.

Vilmar Fistarol, presidente da filial brasileira da Sociedade de Engenharia Automotiva (SAE), prevê que a decisão da GM será seguida pelas demais montadoras. "Estratégias como essa serão inevitáveis", afirma.

Essa movimentação já começou de alguma forma. Fabricantes mais novos no mercado brasileiro já se preocupam em reforçar os times locais. Tanto Renault como o grupo PSA Peugeot Citröen, que representam as marcas francesas, anunciaram a criação de centros de engenharia para diminuir a dependência das matrizes.

As iniciativas não se limitam às áreas dos automóveis. No segmento de caminhões, a Iveco começou a reforçar o departamento de engenharia na fábrica de Sete Lagoas (MG). Segundo Marco Mazzu, presidente da Iveco na América Latina, a empresa está criando um centro de engenharia brasileiro por dois motivos.

"Temos um plano agressivo de desenvolvimento de um produto no Brasil e isso só é possível com um time de engenharia forte. Além disso, queremos ter capacidade de desenvolver produtos para nichos específicos, com participação em plataformas globais", explica o executivo.

O deslocamento da criação de projetos das matrizes das montadoras para as filiais nos países emergentes também ocorre na rede de fabricantes de autopeças. Em dois anos, a Delphi elevou o número de engenheiros no Brasil de 300 para 500. O presidente da Delphi, Gábor Déak, diz que a filial brasileira já está desenvolvendo projetos de chicotes para os Estados Unidos. "Para veículos que jamais serão desenvolvidos aqui", explica. Déak lembra ainda que os brasileiros dominam certos tipos de conhecimento tecnológico, como o dos combustíveis.

É fácil concluir que fazer projetos de novos carros com engenheiros brasileiros custa menos do que nos países desenvolvidos. Segundo os executivos do setor, o custo no Brasil pode chegar à metade do valor nos Estados Unidos. Mas esses mesmos executivos garantem que esse não é o motivo mais forte.

"Nossa indústria tem 50 anos de história; todo esse tempo de desenvolvimento formou uma mão-de-obra cujo valor é reconhecido pelo setor mundialmente", destaca Déak, que também é engenheiro. O executivo diz ainda que a valorização do real tem anulado qualquer vantagem de custos da engenharia brasileira em relação aos países mais desenvolvidos, onde estão as matrizes das companhias automotivas.

No caso da GM, os engenheiros brasileiros farão todos os projetos de picapes médias para mercados de todo o mundo. Antes mesmo dessa reorganização, a equipe da GM do Brasil desenvolveu o Hummer, um veículo utilitário grande fabricado na África para os mercados da Europa, Oriente Médio e também o africano.

"Os projetos vêm para o Brasil muito mais por competência do que por custo", afirma Luc de Ferran, um engenheiro que já cuidou de fábricas da Ford e hoje atua como consultor do setor. "Na Europa, Japão e Estados Unidos, as empresas hoje estão ocupadas com outros problemas. Com isso, nós do Brasil, estamos ficando gigantes", completa.

Volkswagen e Ford criaram novos empregos para engenheiros em 2007. A Volks abriu 120 vagas e tem hoje 1,1 mil profissionais, segundo Holgar Westendorf, vice-presidente de desenvolvimento e tecnologia do produto. "Contamos com estratégias integradas com a matriz para o desenvolvimento de algumas políticas como a de combustível", destaca.

Em dois anos, a equipe de engenharia de produto da Ford passou de 550 para 1,2 mil pessoas. Segundo o presidente da Ford Brasil, a equipe está "mais focada em produtos para a região". Parte dos trabalhos ainda é feito em laboratórios dos Estados Unidos. Mas essa dependência tende a diminuir.

Oliveira defende a liberação das linhas de financiamento para a engenharia automotiva. Como nos últimos meses, essa indústria reduziu as vendas externas em conseqüência da valorização do real, Oliveira sustenta que os programas de produção dos próximos anos precisarão embutir produtos destinados aos mercados externos. Assim, essa indústria precisará voltar a exportar com mais intensidade se o país não quiser ser excluído na cada vez mais agressiva concorrência internacional.

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