29 de abril de 2009

Siemens prevê investir US$ 600 milhões no País


O expressivo crescimento alcançado no Brasil em 2008, de 33%, e um faturamento líquido de R$ 4,6 bilhões chamaram a atenção da gigante alemã Siemens , que na última semana realizou no País uma reunião mundial de diretoria, sob o comando do presidente do grupo, Peter Löscher.

Siemens prevê investir US$ 600 milhões no País

- Na fábrica em Jundiaí, no interior de São Paulo, uma agitação pouco comum toma conta do lugar. Diversos seguranças se apressam e não desgrudam dos radiocomunicadores. Organizam a saída dos diversos carros pretos, de luxo, colocados em fila. Neles embarcam, dois a dois, os membros da alta cúpula da gigante alemã Siemens, que seguem o líder mundial da companhia em sua primeira visita ao Brasil. O movimento tem motivo: há 11 anos não se realizava um evento desse porte, com toda a diretoria mundial reunida no País. O encontro reforça o reposicionamento como uma empresa de infraestrutura, não apenas mundialmente mas também no País, aproveitando os investimentos anunciados pelo governo para este segmento nos próximos anos. Além disso, eleva o País dentro da estrutura global ao posto de um cluster, condição normalmente dada a um grupo de países. Apenas Alemanha, Canadá, Estados Unidos e Japão também são considerados, individualmente, cluster.

Em entrevista exclusiva à Gazeta Mercantil, o presidente mundial do grupo , Peter Löscher - que desde junho de 2007 assumiu o comando da companhia, após a eclosão dos escândalos sobre pagamentos de propina em diversos países -, fala sobre a posição do Brasil como mercado-chave para o crescimento da Siemens e como a reestruturação organizacional implementada entre 2007 e 2008 preparou a empresa para enfrentar a crise global.

Primeiro executivo não alemão a assumir a direção da companhia e sem ter feito carreira no grupo, o austríaco Löscher elogiou a atuação da equipe nacional, que fez a operação crescer quatro vezes mais que o PIB brasileiro. O presidente da Siemens no Brasil, Adilson Primo, destacou que após ter investido US$1 bilhão no País, nos últimos cinco anos, a empresa prevê investimentos de US$ 600 milhões nos próximos quatro anos. A seguir a entrevista.

Gazeta Mercantil - Por que depois de diversos anos sem uma visita da direção mundial, um presidente da Siemens e seus principais executivos vieram ao Brasil?

Löscher - O Brasil é um grande e importante mercado em crescimento para nós, um cluster-chave na organização global. No último ano foi o país de crescimento mais rápido no mundo dentro do grupo e acreditamos no futuro do Brasil e também que a estratégia da empresa - focada em eficiência energética, cuidados com a saúde e automação industrial - responde às mais altas necessidades básicas de infraestrutura do País. O Brasil obviamente foi afetado pela crise, como qualquer outro lugar do mundo, mas tem uma demanda de mercado muito forte, tem um claro programa de estímulo governamental, e está ficando mais forte, segue em frente e por isso nós queremos dar o suporte para o crescimento do País.

Gazeta Mercantil - O que significa transformar o Brasil em um cluster?

Löscher - Para o Brasil significa maior visibilidade global. É uma clara indicação de que vemos o potencial do País, seja do ponto de vista do mercado doméstico, seja da perspectiva da pesquisa e desenvolvimento, desenvolvendo produtos. E vai além do Brasil, com exportações dentro da região e para outras regiões.

Gazeta Mercantil - Qual o resultado da reunião no Brasil?

Löscher - Tivemos um bom diálogo sobre quais são as oportunidades de crescimento agora no Brasil, quais os principais projetos e que recursos vamos aplicar aqui. Vamos continuar a acelerar o crescimento do Brasil, mesmo durante a crise. Nosso objetivo é claramente continuar a desenvolver significativamente nosso negócio versus o PIB brasileiro. Tenho muito orgulho que nos últimos cinco anos, o Sr. Primo e sua equipe conseguiram crescer quatro vezes o crescimento do PIB brasileiro e esta é hoje a base em que construímos nosso futuro no Brasil.

Primo - O foco da reunião da diretoria foi justamente o Brasil. Nós investimos nos últimos cinco anos, considerando novas plantas, extensão de linhas de produção, P&D (Pesquisa e desenvolvimento), investimos quase US$ 1 bilhão. E nossa expectativa nos próximos quatro anos é investir algo em torno de US$ 600 milhões, em novas plantas, novas linhas, infra-estrutura da própria planta.

Gazeta Mercantil - Qual a principal área de investimento?

Primo - Basicamente, indústria e energia são as áreas que consomem maior percentual de investimentos.

Gazeta Mercantil - E em equipamentos médicos?

Primo - Estamos discutindo neste momento com a matriz a possibilidade de podermos ter uma linha de produtos voltados para solução low end (equipamentos com menos funções e, por isso, de custo mais baixo), também para a área de cuidados com a saúde, como ultrassom. Já temos o Raio X e estamos buscando outros produtos para atender este mercado. Na Europa você precisa muito mais de high end e aqui ainda tem áreas que precisam de soluções low end. Temos de nos beneficiar das vantagens que temos aqui: é um país de baixo custo, mão de obra ainda barata, de qualidade. Temos excelentes institutos de pesquisa com o quais mantemos parcerias no País. Essas são vantagens competitivas que a Siemens, como uma companhia global, utiliza em operações no mundo todo.

Gazeta Mercantil - Como a companhia foi afetada pela crise?

Löscher - A crise é uma grande oportunidade para nós. Porque a Siemens é uma empresa que foi fundada há 162 anos, muito forte em propor inovação. Estamos em 190 países do mundo. Muitas outras empresas estão começando a olhar para os países emergentes agora. Estamos no Brasil desde 1867 (o primeiro cliente foi Dom Pedro II, que solicitou uma linha telegráfica entre o Rio de Janeiro e a província de São Pedro, hoje o Rio Grande do Sul, num total de 1.650 km), na Rússia desde 1853, na China desde 1864, na Índia desde 1867 também. Em muitos dos países emergentes estamos presentes há mais de 100 anos. Então temos uma forte posição de liderança nesses mercados, com uma estratégia global de inovação. E essa crise é uma grande oportunidade para ampliar a liderança. A companhia está contratando 100 dos melhores talentos, em diversos países. O Brasil é um grande exemplo da diversidade da nossa força de trabalho, usamos o talento brasileiro para o nosso negócio global. Somos capazes de ligar a diversidade de talentos globais em mais de 190 países.

Gazeta Mercantil - Mas no quarto trimestre de 2008, que corresponde ao primeiro trimestre do ano fiscal da Siemens, a companhia registrou uma redução de 8% nos novos pedidos em comparação com igual período de 2007, sendo que as maiores divisões do grupo, indústria e energia, apresentaram as maiores quedas, de 11% e de 6%, respectivamente....

Löscher - Isso não é verdade. Energia continua a crescer muito, muito forte e conduz o crescimento, com aumento do faturamento no primeiro trimestre do nosso ano, que foram os três últimos meses do ano passado. Continuamos a ter uma forte performance em todos os nossos negócios. Naquele momento nós vimos sinais de que a divisão industrial está caindo, e antecipamos, em comunicado, que os negócios de ciclo curto têm sido evitados após a crise, como negócios de iluminação e de automação industrial. Mas, ainda há uma forte demanda e performance na divisão de energia. E uma das razões pelas quais a Siemens está em uma situação privilegiada é porque temos um bom mix de negócios de ciclos curtos e longos, 70% de ciclo longo e 30% de ciclo curto e há um balanço de oportunidades.

Gazeta Mercantil - O Sr. considera que tenha havido ou que ainda possa haver alguma perda devido ao escândalo de corrupção que a Siemens enfrentou entre 2006 e 2007?

Löscher - Nós claramente demonstramos que isso ficou para trás, que é coisa do passado. Nós enfrentamos um momento difícil, mas conseguimos altas taxas de crescimento. Mostramos os dados corporativos, cada registro, o que fosse necessário, e, portanto, isso ficou esclarecido e superado e não deve afetar os negócios futuramente.

Gazeta Mercantil - O que a Siemens faz para evitar problemas semelhantes no futuro?

Löscher Nós somos reconhecidos como líderes globais devido à forma como organizamos a nossa verificação de compliance (termo corporativo que se refere ao comportamento ético nos negócios). E fomos reconhecidos por órgãos independentes, como o índice de sustentabilidade do Dow Jones. Em 2007 tínhamos zero pontos e em 2008 obtivemos 93 pontos nos códigos de conduta de compliance, o que nos tornou líderes globais em compliance. Nossos esforços foram reconhecidos externamente pelos consumidores e por fontes independentes.

Gazeta Mercantil - A reestruturação operacional da companhia, de alguma forma, a ajudou a enfrentar a crise que o mundo atravessa agora?

Löscher - Totalmente. O grande benefício que tivemos é que, ao definir nossa linha estratégica, com foco em energia, automação industrial e cuidados com a saúde, nós organizamos a operação global e a simplificamos para torná-la mais próxima dos consumidores, tornando os consumidores próximos das fábricas, e para ter mais agilidade nos processos de tomada de decisões. Nós finalizamos este processo no ano passado e reduzimos nossos custos com a redução de camadas na nossa organização global e, em seguida, entramos na crise, significativamente mais forte que muitos outros competidores. E este é, atualmente, um dos nossos principais benefícios que nos deixa em forma para enfrentar o cenário atual. Nós vamos anunciar no dia 29 (hoje) que estamos focados em otimizar a nossa cadeia de suprimentos global.

Gazeta Mercantil - Então a Siemens reencontrou sua vocação?

Löscher - Siemens está forte, tem uma linha estratégica e está bem-preparada para enfrentar a crise. Este é o motivo pelo qual acreditamos que vamos passar bem por esta crise. A crise chegou à Siemens, mas a Siemens não está na crise como muitos dos nossos concorrentes, esta é a diferença.

Gazeta Mercantil - O retorno do foco no negócio entre empresas significa que a Siemens não teve uma boa experiência com o consumidor final?

Löscher - De maneira nenhuma. Mas decidimos fortalecer a posição como uma companhia de infraestrutura, onde somos líderes. A Siemens é a melhor em soluções para grandes projetos estruturais, com uma diversificada área de atuação: mobilidade, eficiência energética, diagnósticos. Nosso foco em ser provedor de infraestrutura, isso é clareza de estratégia.

Gazeta Mercantil - Quais são os planos para cada uma das divisões?

Löscher A Siemens hoje é uma gigante de infraestrutura verde. Temos € 19 bilhões no portfólio verde, um dos maiores e mais amplos na área ambiental em todo o mundo, e esta é a maior estratégia da companhia em todas as áreas. Dois terços dos negócios em que estamos, globalmente, somos número um ou número dois. A Siemens investe € 3,8 bilhões em Pesquisa e Desenvolvimento, dos quais cerca de um € 1 bilhão no portfólio verde, que tem mais de 38 inovações por dia. Investimos continuamente em inovação para o futuro.

Gazeta Mercantil - Em que tipo de inovação verde a Siemens foca seus esforços?

Löscher - Em geração de energia, por exemplo, fabricamos a turbina mais eficiente do mundo. Somente este ano, evitamos a emissão de carbono correspondente a 10 mil carros médios dirigindo 20 mil quilômetros por ano, é um enorme ganho de eficiência. Temos a mais eficiente linha de transmissão HVBC (corrente direta de alta voltagem). Em consumo de energia, temos um grande foco em eficiência, com tecnologias de construção e de iluminação que podem reduzir em, por exemplo, 20% o consumo de energia, há muitas soluções neste sentido.

Gazeta Mercantil - Como o Brasil entra nesta estratégia?

Primo - O Brasil é um país em que boa parte da matriz energética vem de energias renováveis. Temos um centro de competência para a área de açúcar e etanol, para usinas hidroelétricas. Também estamos desenvolvendo soluções para a área de saneamento e para a Petrobras tornar as plataformas mais eficientes. Então, estamos atrelados a esta política global dando uma contribuição local. Evidentemente temos todo o suporte da operação global, mas desenvolvemos aqui soluções locais adaptadas às necessidades regionais. E isso deve ser levado ao exterior. Já estamos exportando a área de açúcar e álcool para países da América Latina e Central e esse expertise foi desenvolvido aqui. A fábrica de Jundiaí está desenvolvendo chaves seccionadoras para a Índia. Ou seja, o centro de competência é aqui, nós desenvolvemos para a nossa operação na Índia. Acho que o Brasil tem muito mais a desenvolver nesta área de produtos ecologicamente corretos.

Gazeta Mercantil - Qual é a estratégia para a divisão de saúde?

Löscher - Em cuidados com a saúde, a Siemens é a única com um portfólio completo em toda a cadeia de diagnósticos, in vitro (exames laboratoriais) e in vivo (imagens), e estamos ligando estas duas áreas em uma solução integrada em tecnologia da informação. Estamos otimizando o fluxo de trabalho clínico via web para os clientes. Nos últimos anos investimos mais de € 10 bilhões nesta área e durante a crise queremos continuar a ser um parceiro em inovação nesta área.

Gazeta Mercantil - Qual é o foco de pesquisa nesta área?

Löscher - Estamos trabalhando para identificar doenças mesmo antes de os sintomas aparecerem, para identificar a origem da doença em nível molecular. Temos tecnologias que permitem aos médicos identificar marcadores genéticos que podem mostrar a propensão de um indivíduos a determinada doença. E neste esforço, temos trabalhado junto com as empresas farmacêuticas para sermos capazes de identificar as doenças como câncer e Alzheimer em um estágio bem inicial. Poderemos identificar essas doenças antes mesmo de os sintomas aparecerem. E aí seremos capazes de indicar um tratamento que funcione para aquele paciente. Então estaremos em um nível de diagnóstico sob medida associado ao tratamento sob medida. Isso mudará o paradigma de como tratamos as doenças hoje.

Gazeta Mercantil - A sua carreira na indústria farmacêutica o ajuda na posição atual?

Löscher - Sem dúvida. Mas a estratégia não depende de mim, já fazia parte da Siemens há muito tempo, faz mais de uma década que a Siemens pesquisa soluções de diagnósticos continuamente. Obviamente que, com a minha vinda, pude dar total suporte para a decisão estratégica que a Siemens já havia estabelecido antes. A chave é que nossas pesquisas e desenvolvimentos globais estão liderando pesquisas e desenvolvimentos para reconhecer esses campos e trabalhar muito próximo com as pesquisas dos laboratórios e podem tornar este novo paradigma uma realidade.

Gazeta Mercantil - No início do ano, a Siemens informou que reduziria investimentos em ampliação da capacidade. Houve um rearranjo?

Löscher - O que dissemos é que obviamente reduzimos investimentos de capital (capex) globalmente. Buscamos encontrar uma orientação do ponto de vista das prioridades globais. Há diversos aspectos que procuramos avaliar. Mas vamos continuar a investir no Brasil, que é um mercado em contínuo crescimento, vamos continuar a investir no futuro da nossa operação Brasil, e apostar no mercado, em energia, no trem de alta velocidade, em todas as nossas áreas, e em pesquisa e desenvolvimento.

Gazeta Mercantil - Como a crise afeta as margens da companhia? Houve alguma mudança nas metas?

Löscher - Obviamente nesta crise avaliamos desempenhos em bases trimestrais. Até agora em suas bases totais, as nossas metas não foram modificadas.

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