Nem todos os bancos estrangeiros estão soterrados por pilhas de créditos imobiliários de alto risco, pesadas baixas contábeis e prejuízos crescentes a ponto a desacelerar as operações nos mercados externos. É o caso da portuguesa Caixa Geral de Depósitos (CGD), que, apesar da séria crise internacional, está desembarcando (e investindo) no Brasil.
A CGD é estatal e domina 30% do mercado português. Rodolfo Lavrador, membro do conselho de administração da CGD, revelou ao Valor os planos do banco para o Brasil em visita que fez a São Paulo na primeira quinzena de dezembro.
O banco não vê muito espaço mais em Portugal e resolveu crescer no exterior. "Portugal é um mercado maduro. O crescimento orgânico é difícil e não faz sentido comprar bancos privados quando já se tem o domínio do mercado. A estratégia foi então crescer fora de Portugal e ajudar as empresas portuguesas que estão buscando novos mercados", disse Lavrador.
A decisão foi tomada antes de a crise financeira internacional estourar e foi mantida. "Preferíamos que a economia mundial estivesse diferente. Mas não é o caso. Apesar disso, não deixaria de ser tomada nesse conjuntura", afirmou. Por ter controle estatal e uma história de 132 anos, ativos totais de 108,3 bilhões de euros e patrimônio de 4,8 bilhões de euros, a CGD foi até beneficiada pelo movimento de "flight to quality" dos investidores, disse Lavrador, lembrando que o banco foi um dos raros europeus que não teve o rating duplo A afetado na turbulência atual.
A escolha do Brasil era inevitável. "O Brasil sempre foi o mercado incontornável. É natural crescer no país dada as afinidades históricas e culturais e pelo fato de ser o destino de muitos investimentos portugueses. Há também muitas empresas brasileiras em Portugal. Acreditamos no Brasil. É um país que só pode dar certo", explicou Lavrador.
Na verdade, a CGD está recomeçando a operar no Brasil. Durante muitos anos, o banco português teve uma participação relevante no Banco Itaú até 1998, quando comprou o Bandeirantes, banco brasileiro de varejo. Em 2000, a CGD concluiu que era difícil disputar o varejo brasileiro e vendeu o Bandeirantes ao Unibanco, em troca de uma participação acionária de 12,3%. Em 2005, a CGD vendeu a participação no mercado, apurando R$ 1,534 bilhão.
O projeto agora é bem diferente. "O mercado brasileiro está em fase de concentração e amadurecimento. Não era lícito retomar o projeto de 10 anos atrás e tentar novamente o varejo. A CGD sempre teve vocação de liderança. No Brasil, os líderes são de capital nacional. Por isso estamos montando um banco de atacado, modelo que faz sentido no momento e é suficiente para acompanhar o fluxo comercial entre os dois países" disse Lavrador.
Em 2007, a CGD pediu ao Banco Central (BC) autorização para reabrir o banco no Brasil; o sinal verde saiu em fevereiro de 2008. O projeto agora é fazer operações corporate, de banco de investimento e financiamento de comércio exterior. Para montar o banco, que tem o nome de Banco Caixa Geral - Brasil S.A., a CGD contratou Debora Vieitas para diretora presidente. Debora trabalhou por 12 anos no CCF e por oito anos no BNP Paribas, até outubro passado, e está animada em fazer decolar do zero o banco de atacado da Caixa Geral.
Segundo Lavrador, o capital de partida do banco é de R$ 123 milhões. Existe a disposição de aumentar o valor quando o projeto crescer. Geograficamente, o banco começará atuando em São Paulo e depois vai se expandir para o Rio e outras regiões. O conselheiro da CGD dá como certa a presença no Nordeste onde há muito investimento português.
Mesmo durante a crise, a CGD manteve as linhas de crédito comercial para o Brasil, que somam 600 milhões de euros e são canalizadas por outros bancos, como o Banco do Brasil (BB). Com o banco próprio, é natural que ele concentre a distribuição das linhas.
Debora disse que o banco fará também financiamento de projetos, assessoria em fusões e aquisições e dívida estruturada, e repasses do BNDES.
O banco começa a funcionar neste mês de janeiro. Ao longo de dezembro, foram feitos os testes de entrada no Sistema Brasileiro de Pagamentos. Ele surgiu a partir do Banco Financial Português, implantado no Brasil desde o século 19, que será transformado em banco múltiplo com as carteiras comercial, de investimento e câmbio. Na primeira fase, terá 40 a 50 funcionários, com boa bagagem de risco de crédito, operacional e de mercados. O "foco será atender empresas brasileiras e estrangeiras, financiar o comércio exterior, capturar negócios de investimento na península ibérica, países da África onde tem presença física. Capturar o fluxo de negócios", disse Debora.
Apesar de não ter estado presente diretamente no Brasil nos últimos anos, a CGD, por meio de seu banco de investimento, o Caixa Banco de Investimento, tem tido atuação intensa no mercado. Na área de fusões e aquisições, obteve mandatos de assessoria à Companhia Brasileira de Distribuição (CBD, do grupo Pão de Açúcar) na aquisição dos Supermercados Sé; à Embraer na aquisição da OGMA em Portugal; à Portugal Telecom na venda da Primesys; à Águas de Portugal na venda da Prólagos; e à Editora Abril na venda da Abril Control Jornal em Portugal.
Na área de operações estruturadas e financiamento de projetos, atuou como líder nas operações da Energias do Brasil no empréstimo tipo B do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) à Bandeirantes Energia; da Endesa no empréstimo tipo B da International Finance Corporation (IFC) à Endesa Fortaleza; da Iberdrola no empréstimo B do BID à Termo Pernambuco; da Brasil Saneamento no projeto de tratamento de águas industriais à ThyssenKrupp; e da Abengoa no financiamento ATE2 Transmissora de Energia - Lote A LT Colinas - Sobradinho.
Na área de mercado de capitais, participou da oferta inicial de ações (IPO, na sigla em inglês) da Energias do Brasil, da Bradespar e da oferta secundária do Unibanco.
A CGD já está presente em 23 países, entre eles Espanha e Angola (com operações de varejo), África do Sul, Moçambique, Cabo Verde, São Tomé e Príncipe. Na Ásia, está em Macau, Timor Leste e Índia. Tem 210 agências na Espanha e 50 na França. A atividade internacional representa de 15% a 20% dos resultados.
A Caixa Geral de Depósitos (CGD) está a enviar aos seus clientes mais modestos uma circular que deveria fazer corar de vergonha os
administradores - principescamente pagos - daquela instituição bancária.
A carta da CGD começa, como mandam as boas regras de marketing, por reafirmar o empenho do Banco em oferecer aos seus clientes as melhores condições de preço qualidade em toda a gama de prestação de serviços, incluindo no que respeita a despesas de manutenção nas contas à ordem.
As palavras de circunstância não chegam sequer a suscitar qualquer tipo de ilusões, dado que após novo parágrafo sobre racionalização e eficiência da gestão de contas, o estimado/a cliente é confrontado com a informação de que, para continuar a usufruir da isenção da comissão de despesas de manutenção, terá de ter em cada trimestre um saldo médio superior a EUR1000, ter crédito de vencimento ou ter aplicações financeiras associadas à respectiva conta.
Ora sucede que muitas contas da CGD,designadamente de pensionistas e reformados, são abertas por imposição legal.
É o caso de um reformado por invalidez e quase septuagenário, que sobrevive com uma pensão de EUR243,45 - que para ter direito ao piedoso subsídio diário de EUR 7,57 (sete euros e cinquenta e sete cêntimos!) foi forçado a abrir conta na CGD por determinação expressa da Segurança Social para receber a reforma.
Como se compreende, casos como este - e muitos são os portugueses que vivem abaixo ou no limiar da pobreza - não podem, de todo, preencher os requisitos impostos pela CGD e tão pouco dar-se ao luxo de pagar despesas de manutenção de uma conta que foram constrangidos a abrir para acolher a sua miséria.
O mais escandaloso é que seja justamente uma instituição bancária que ano após ano apresenta lucros fabulosos e que aposenta os seus
administradores, mesmo quando efémeros, com «obscenas» pensões (para citar Bagão Félix), a vir exigir a quem mal consegue sobreviver que contribua para engordar os seus lautos proventos.
É sem dúvida uma situação ridícula e vergonhosa, como lhe chama o nosso leitor, mas as palavras sabem a pouco quando se trata de denunciar tamanha indignidade.
Esta é a face brutal do capitalismo selvagem que nos servem sob a capa da democracia, em que até a esmola paga taxa.
Sem respeito pela dignidade humana e sem qualquer resquício de decência, com o único objectivo de acumular mais e mais lucros, eis os
administradores de sucesso.