26 de maio de 2008

O mundo de Lula


O MUNDO MUDOU. E O PRESIDENTE LULA está a par disso. Prova cabal é o novo mapa-múndi que ele ostenta em seu gabinete, no Palácio do Planalto. Num sutil truque de vista, a América do Sul e a África estão destacadas, nos mesmos moldes que os europeus faziam à época de suas expedições marítimas e apontavam o Velho Mundo como o centro do planeta. A foto que ilustra esta matéria representa como a geopolítica mundial é vista pelo governo brasileiro e demonstra agressividade: o mundo de Lula é o Sul, posição que vem sendo defendida fielmente pelo Itamaraty e cujo resultado se materializa na balança comercial.

O exemplo mais contundente dessa mudança foi a recente Cúpula América do Sul-União Européia. A caminho de Lima, no Peru, chefes de Estado europeus fizeram questão de pagar pedágio no Brasil. Em outros tempos, eles chegavam ao Brasil com a clara intenção de impor suas agendas. O panorama, hoje, mudou. O descolamento da crise econômica mundial, o recém-concedido grau de investimento e o aval internacional sobre a nossa política de combustíveis, que já diferencia a cana-de-açúcar de outros produtos, deram ao Brasil um peso que jamais chegou a ter. "A política externa conseguiu a proeza de mirar a África e a América do Sul e acertar a Europa e os Estados Unidos", analisa André Nassar, diretor-geral do Instituto de Estudos de Comércio e Negociações Internacionais. "Por mais que tenhamos problemas pontuais, há um posicionamento de destaque no Brasil como player mundial."

Esse posicionamento foi exercido no primeiro encontro dos Brics, a sigla que reúne os quatro maiores países em desenvolvimento. Reunidos em Ecaterimburgo, no último dia 16, os chanceleres do Brasil, da Rússia, da Índia e da China mostraram que o bloco é mais que uma definição do Goldman Sachs. Em um comunicado de 13 itens, o chanceler Celso Amorim conseguiu extrair pelo menos dois pontos de extrema importância. O primeiro foi o apoio formal aos biocombustíveis.

Ainda que haja a preocupação com a segurança alimentar, o etanol foi posto como alternativa ao cenário energético atual. "Enfatizamos a necessidade de programas que aumentem o acesso à energia, incluindo os biocombustíveis, compatíveis com o desenvolvimento sustentável", diz o texto.

O segundo item foi uma menção explícita às aspirações diplomáticas brasileiras. O comunicado afirma que "a cooperação Sul-Sul é um elemento importante para o desenvolvimento mundial". É uma declaração que poderia ter saído da boca do próprio presidente Lula. "O processo de integração está realizando o que a América do Norte fez no século XIX: a união entre o Atlântico e o Pacífico", disse à DINHEIRO o ministro Celso Amorim. "Esses encontros mostram que a geografia mundial está mudando."

Há um nítido aumento na percepção externa sobre o Brasil. Em sua primeira visita ao País, a chanceler alemã Angela Merkel destacou que a Alemanha não voltará atrás da decisão de incorporar 10% de etanol à gasolina até 2010. Foi um aval à política de combustíveis espraiada pelo mundo por Lula. "Desde aquele primeiro discurso na ONU, sobre segurança alimentar, o presidente Lula atraiu uma atenção diferenciada para o Brasil", analisa Riordan Roett, brasilianista da Universidade Johns Hopkins, em Washington. "Houve um benefício imediato: Lula despertava interesse por ser um estranho ao mesmo tempo tinha embasamento para pedir mais por países esquecidos, como os africanos e o Brasil".

Logo que assumiu o governo, em 2003, Lula fez questão de orientar o chanceler Celso Amorim a investir recursos para agregar os países africanos ao Brasil. De lá para cá, 15 embaixadas e um escritório político foram abertos no continente. É, de longe, o maior número de representações criadas nas últimas décadas. "Havia um vácuo e precisávamos preenchê-lo", corrobora Fernando Magalhães, chefe do Departamento da África do Itamaraty. O resultado aparece na balança comercial.

Desde o início do governo, o comércio bilateral saltou de US$ 5 bilhões para US$ 20 bilhões. Se fosse tomada em conjunto, a África seria hoje o quarto maior parceiro do Brasil. Grandes empresas brasileiras como Petrobras, Vale e Odebrecht expandem suas operações por lá. "Não participar desses movimentos pode colocar as empresas brasileiras à mercê da desestabilização de suas condições de inserção competitiva no mercado mundial", avalia Roger Agnelli, presidente da Vale. O continente desponta também como opção para empresas exportadoras de áreas como vestuário, calçados e alimentos. "Estamos vivendo uma febre de África", diz Luis Carlos Pereira, gerente de exportações do grupo Mabel. "Ela já representa 40% das nossas exportações."

Com a América do Sul não foi diferente. Mesmo com uma malha diplomática em todos os países da região, o Itamaraty criou quatro consulados. No comércio, a balança mudou de déficit de US$ 136 milhões para superávit de US$ 13,3 bilhões. A mesma linha de aproximação com o Sul vem sendo seguida pela Embrapa. Foi a empresa que preparou o mapa de Lula. A justificativa pelo destaque dos dois continentes é que são as duas localidades onde há escritórios da Embrapa - ainda que Estados Unidos, Holanda e França também abriguem laboratórios da estatal. O mais recente, na Venezuela, foi inaugurado em março. O outro, em Gana, foi criado em 2006. "É uma forma de ajudar países que não têm estrutura a poupar 30 anos de pesquisa", explica Silvio Crestana, presidente da Embrapa. A Fiocruz deverá fazer o mesmo em Moçambique.Isto é Dinheiro num. 0556

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